sábado, 17 de dezembro de 2011

UM OLHAR SOBRE A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA

             Escrevi este texto homenageando a minha amiga e reitora da UFAM Márcia Perales, que é amante da Extensão.

           A academia tem deixado a desejar em algumas áreas. É tão bem treinada no discurso e nos projetos pessoais, mas ainda mantém-se bastante distante das áreas de colaboração prática. Precisamos questionar a participação da comunidade científica nas questões mais urgentes da vida social. Em minha opinião, a academia detém uma grande dívida principalmente para com os marginalizados sociais. A Universidade, bem como as Instituições de Ensino Superior em geral, devem agir em direção a um compromisso público com a maioria que lá não está (mas que as sustenta, no caso das IES públicas).




          Ora, as demandas sociais precisam do saber profissional e científico (é claro!), mas este deve ser construído na base de parcerias, inclusive parcerias com as populações, com os grupos sociais, com as igrejas, com as escolas, enfim. Os intelectuais precisam estar comprometidos com a luta contra a miséria e a injustiça social.
           Uma boa forma de, pelo menos tentar, é envolver-se em atividades de Extensão. Compete aos intelectuais problematizar todas as dimensões da sociedade, problematizar a cultura, a vida, o destino humano. Ora, é para atender a estas demandas que se diz que um dos tripés do ensino superior é o da Extensão Universitária. Quão maravilhoso seria se todos os professores tivessem esta preocupação: estender seu olhar, suas mãos, seus cérebros!
           As Universidades e Faculdades têm que ser servidoras da sociedade, e não apenas dos que estão em seus quadros, porque estes, por alguma razão conseguiram vencer o afunilamento injusto. Seus olhares têm que estar, também, para fora, numa atitude de responsabilidade para com as pessoas, a nação e para com o mundo em geral. Muitos são os desafios que se colocam diante dos profissionais atentos às demandas da história e de seu povo, principalmente nestes tempos em que a chamada sociedade pós-moderna e a cultura capitalista estão em crise.
          O Brasil ainda é um país socialmente injusto, marcado por desigualdades e exclusão das maiorias constantemente chamadas de “minorias”. É comum se ouvir a estatística de que cerca de 18% da população consome 80% dos recursos não-renováveis. Esta é uma grande contradição, quando se entende que o alvo do desenvolvimento não deve ser o mercado nem o capital, mas todos os seres humanos, numa grande caravana pela inclusão social. O que é o “desenvolvimento” senão o melhoramento do bem-estar de toda a população e de cada indivíduo na base de sua participação ativa, livre e significativa e na justa distribuição dos benefícios resultantes dele? (Declaração sobre o Direito dos Povos ao Desenvolvimento – ONU, 1993).  
          Este “bem-estar geral” certamente poderá ser potencializado pela Educação, pela Pesquisa e pela Extensão Universitária. A Educação capacita o ser humano a pensar sobre sua vida individual e social, capacita as pessoas a apropriar-se do conhecimento científico e cultural acumulado pela humanidade, e, mais que isto, capacita a refletir criticamente sobre este conhecimento transformando-o, tornando-se autônomo e menos sujeito à dominação. A Pesquisa faz o conhecimento avançar, faz ultrapassar barreiras do anteriormente desconhecido. A Extensão, por sua vez, pode colaborar para que as pessoas saiam da ignorância e desejem o saber, pois é esta ignorância que não o deixa ver a perversidade dos projetos sociais e políticos que mantém suas vidas na submissão. Aqui está a responsabilidade e a dívida da academia.
          A Extensão pode colaborar, inclusive, para que os jovens se vejam na Universidade, desejem estar lá, entendam sua importância, e cobrem ações e políticas públicas para ampliar seu acesso. Ora, Universidade e população têm que se relacionar mutuamente, cobrando, assessorando e fiscalizando o governo e as instituições no serviço que prestam ao bem comum. A Extensão é um excelente caminho da solidariedade.
          Há um enorme grupo que espera sua cidadania como concessão do Estado ou dos políticos, numa postura acostumada com o assistencialismo fácil, que busca saciar as carências sem passar pela conscientização. A população pobre geralmente é dependente dos benefícios públicos e acredita que as mudanças dependem dos que detém o poder, nunca dela mesma (geralmente é assim). Assim, aqueles que têm uma compreensão mais ampliada, precisam pensar em projetos que ajudem a democratizar as relações sociais, para criar formas mais efetivas de participação. A situação do povo tem que incomodar a academia. Precisamos olhar para fora dos nossos laboratórios e escritórios. Temos que criar coragem para intervir, transformando nossa prática interna e externa, buscando ajustar eticamente a nossa ação social.
          Vai daí que, as ações que se efetivam nos espaços do Ensino Superior devem sempre ser iluminadas pelas perguntas: Como podemos ouvir o que a comunidade precisa? Como podemos fazer com que o conhecimento gerado aqui chegue de forma aplicada às comunidades? Como efetivar a intervenção que está ao meu alcance?
          Se os estudantes forem ensinados a também ter estas preocupações, durante todo o período da formação profissional, e a verem nos professores o exemplo, estaremos todos sendo despertados para a necessidade de vencer o egoísmo e de olhar fraternalmente para o outro – até para isto servem as atividades de Extensão.
          A Extensão Universitária significa o conhecimento saindo e voltando: saindo dos muros da Universidade e retornando com feed-backs preciosos que mostrarão outras necessidades e iluminarão novos caminhos. Significa ensinar as pessoas e aprender com as pessoas. Significa avaliar a importância das atividades que se está desenvolvendo nos laboratórios, nos núcleos, nos centros acadêmicos. Significa levar à sociedade o conhecimento que se produz na academia e buscar o conhecimento que se produz na sociedade, no saber popular.
          Aprender sem praticar não é o melhor. Aprender sem contextualizar, sem analisar a realidade, não é possível. Por isto a Extensão é tão importante: porque é parceira da prática.
          O professor completo ensina, pesquisa e “faz extensão”. Ele está sempre interessado em repartir o que sabe, em reinterpretar o conhecimento com outras lentes – as lentes de quem está fora de seu círculo acadêmico. Assim fazendo, ele consegue levar seus estudantes a também terem uma postura de inquietação diante das demandas sociais. É alguém que não se contenta em apenas repetir, reproduzir, mas, que está interessado em buscar novos conhecimentos, novas propostas, novas soluções, novas interpretações para as situações sociais que se apresentam clamando por criatividade e comprometimento político. O professor completo está sempre insatisfeito consigo mesmo. Ele leva aos estudantes esta insatisfação benigna.
          A Extensão é um ótimo espaço para a Universidade dar concretude aos seus objetivos, para efetivar sua missão, para descobrir novos contextos de investigação, para sugerir formas de vencer os desafios da realidade social. É um ótimo espaço para vivenciar práticas profissionais em situações e demandas concretas, para formar no estudante um comprometimento com os outros.
          Dizem que o Ensino sem a Pesquisa é mera informação, ou mera teorização desvinculada da prática, assim também, o Ensino sem a Extensão é perda de oportunidade, é perda de enriquecimento, é perda de recursos. O Ensino sem a Extensão cheira a egoísmo...